COVID-19: Perdão de penas, indultos, licença de saída e liberdade condicional antecipada

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Face à atual situação de emergência de saúde pública ocasionada pela doença Covid-19, qualificada pela Organização Mundial de saúde, no passado dia 11 de março de 2020, como uma pandemia internacional, as Nações Unidas, através de mensagem da Alta Comissária para os Direitos Humanos, de 25 de março, aconselharam os Estados membros a adotar medidas urgentes para evitar a devastação nas prisões, considerando formas tendentes a libertar os reclusos particularmente vulneráveis à COVID-19, designadamente os mais idosos, os doentes e os infratores de baixo risco.

Considerando que Portugal tem atualmente uma população prisional de 12 729 reclusos alojados em 49 estabelecimentos prisionais, por forma a proteger a saúde dos reclusos e de todos os que exercem funções no sistema prisional e a minimizar o risco de contágio da doença Covid-19 decorrente da concentração de pessoas no interior daqueles estabelecimentos, após proposta do governo, foram aprovadas, pela Lei nº 09/2020 de 08 de abril, cuja vigência se iniciou a 11 de abril, medidas excecionais de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça.

A Lei nº 09/2020 permite a libertação de reclusos, perante a verificação de determinados pressupostos, em quatro situações distintas, a saber: perdão parcial de penas de prisão, regime excecional de indulto das penas, regime extraordinário de licença de saída administrativa de reclusos condenados e antecipação extraordinária da colocação em liberdade condicional.

Apenas os reclusos já submetidos a julgamento e em consequência condenados a pena de prisão efetiva por decisão transitada em julgado anteriormente à entrada em vigor da presente lei, poderão beneficiar dessas quatro medidas excecionais, ficando excluídos os arguidos que se encontrem em prisão preventiva, relativamente aos quais a legislação excecional prevê o dever do juiz do processo proceder ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva, nomeadamente em relação aos que tenham idade igual ou superior a 65 anos e sejam portadores de doença física ou psíquica ou apresentem grau de autonomia incompatível com a normal permanência em estabelecimento prisional.

Ficam também excluídos da aplicação de qualquer das referidas medidas excecionais os condenados por crimes cometidos contra membros das forças policiais e de segurança, das forças armadas, funcionários e guardas dos serviços prisionais, no exercício das suas funções.

O perdão parcial de penas de prisão poderá ser concedido, após apreciação judicial, aos condenados a pena de prisão de duração igual ou inferior a dois anos e também aos condenados em pena de prisão efetiva de duração superior, desde que o tempo restante para o cumprimento integral da pena seja igual ou inferior a dois anos e o recluso tenha cumprido, pelo menos, metade da pena em que foi condenado.

A concessão dos indultos, como forma particular de proteção da população prisional mais expostos ao risco de contração da doença Covid-19 pela especial vulnerabilidade do seu estado de saúde, poderá beneficiar os reclusos com mais de 65 anos e que cumulativamente sejam portadores doença física ou psíquica, ou de um grau de autonomia incompatível com a normal permanência em meio prisional no atual contexto de surto epidémico.

A concessão de indultos, à semelhança do que sucede com a concessão de perdão parcial das penas, não será automática, ficando dependente de decisão do Presidente da República na sequência de proposta apresentada pelo Ministério da Justiça ou pedido apresentado pelos interessados ou por advogado no prazo de três dias úteis após a entrada em vigor da Lei nº 9/2020.

Por forma a assegurar equilíbrio entre a saúde da comunidade prisional e o direito dos cidadãos à segurança e tranquilidade públicas, o perdão parcial da pena e os indultos não poderão ser concedidos aos condenados pelos crimes considerados mais graves, como sejam, homicídio violência doméstica, maus tratos, crimes contra a liberdade sexual e autodeterminação sexual, roubo qualificado, associação criminosa, corrupção, branqueamento de capitais, incêndio e tráfico de estupefacientes de maior gravidade. Ficarão também excluídos deste regime excecional os crimes cometidos por titular de cargo político ou alto cargo público no exercício das suas funções ou por causa delas, e crimes cometidos membros das forças policiais e de segurança ou funcionários e guardas dos serviços prisionais, no exercício das suas funções, envolvendo os direitos, liberdades e garantias pessoais dos cidadãos, independentemente da pena aplicada.

Além desses regimes que permitem uma imediata devolução à liberdade sem qualquer restrição à mesma além das impostas a todos os cidadãos pelas medidas excecionais aprovadas pelo governo, através do Decreto 2.º-B/2020, de 02 de abril, como forma de contenção de contágio, a Lei nº 09/2020 prevê ainda dois regimes, subordinados à obrigação de permanência na habitação, potencialmente aplicáveis aos restantes reclusos como forma de acautelar o surgimento de focos de infeção nos estabelecimentos prisionais e a prevenir-se o risco do seu alastramento – o regime extraordinário de licença de saída administrativa de reclusos condenados e a antecipação extraordinária da colocação em liberdade condicional.

O regime extraordinário de concessão de licença de saída, aplicado por decisão do diretor-geral de Reinserção e Serviços Prisionais, permite ao recluso a saída do estabelecimento prisional pelo período de 45 dias, renovável por idênticos períodos em função da evolução do surto epidémico, nos casos em que o recluso que já tenha beneficiado com sucesso de, pelo menos, uma licença jurisdicional, não exista relativamente ao mesmo qualquer situação de evasão, ausência ilegítima ou revogação da liberdade condicional durante o último ano e seja expectável que o recluso se comporte durante esse período de modo socialmente responsável.

O regime de antecipação extraordinária da colocação em liberdade condicional permite a antecipação em seis meses da colocação em liberdade condicional, cuja aplicação depende de decisão do Tribunal de Execução das penas, nos casos em que o condenado já tenha gozado, com êxito, do regime extraordinário de licença de saída administrativa.


Mónica Salvador – Advogada

O presente artigo é meramente informativo e tem carácter geral e abstrato.

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